A cidade de Belém/PA foi palco de um dos principais encontros recentes de um partido político. O PSOL realizou um amplo debate em torno de que Amazônia queremos? Tendo como insígnia de “Vamos Amazonizar o PSOL” promoveu a mobilização de quadros e representantes da região. Os trabalhos possibilitaram olhares múltiplos que envolveram a expertise acadêmica e popular. Vozes indígenas, quilombolas, camponesas e da classe trabalhadora – filiada ou não ao partido – promoveram junto às representações dos estados amazônicos e da setorial ecosocialista, além de membros da direção nacional do PSOL, reflexões fundamentais que resultaram em um documento orientador do partido e seus militantes.
Ao tentar responder a pergunta central do encontro é necessário partir da encruzilhada que nos apresenta a recente ocupação da Amazônia – protagonizada pelo PoloAmazônia, aprovado em 1975, durante a ditadura militar, como anexo ao II Plano Nacional de Desenvolvimento. Essa ferramenta de destruição da floresta, contaminação das águas e aniquilação de povos continua em plena execução, reproduzindo modelos excludentes, impostos pela centralização da riqueza, estruturada por uma equivocada política extrativista, herdada dos tempos da Colônia do Grão- Pará.
Portanto, fundamentalmente precisamos definir qual caminho escolher. Continuaremos a programar esse modelo estruturado no autoritarismo destruidor, não apenas do meio ambiente, mais também de vidas. Ou trilharemos pelo caminho do fortalecimento dos povos, das liberdades e da garantia do direito à vida. No documento aprovado, pelo PSOL, a segunda proposta deve ser um passo fundamental na defesa do território para indígenas, quilombolas e camponeses como meio de projetar a vida, fortalecer a proteção ambiental e estruturar um modelo de produção de alimentos baseado na agroecologia.
As vozes Munduruku, Tembé, Yanomami, Macuxi, Arara entoaram seu grito de resistência contra as graves violações protagonizadas pela inércia do governo e a ação concreta dos megaprojetos de extrativismo mineral e vegetal, legais ou não, sobre os seus territórios. Compreender a diversidade dos povos indígenas e seu direito ao território e o seu modelo de etnodesenvolvimento baseado no bem viver é promover à diversidade ecológica, essencial a vida de cada um de nós, trabalhadores do campo de da cidade.
Os tambores de resistência ecoaram o chamado dos quilombos da Amazônia na luta pelo seu direito a terra, mais também de resistência aos projetos de mineração e os desertos verdes, promovidos pela soja, dendê, milho, cana de açúcar que protagonizam conflitos, principalmente nos territórios ainda não reconhecidos pelo governo, inerte a dedretação de novos quilombos remanescentes nos últimos 6 anos. A defesa do direito de existir é fundamental para superar a lógica destrutiva do capitalismo que ocupa os rincões da Amazônia, reproduzindo o modelo concentrador de riqueza e potencializador de mortes, não apenas dos líderes dos movimentos de resistência, mas também de comunidades forçadas a deslocamentos para centros urbanos.
É fundamental que estabeleçamos quando pensamos a Amazônia o reconhecimento em nossa constituição do direito a natureza, como princípio fundamental à vida e cláusula pétrea. Alcançarmos esse estágio de desenvolvimento é necessário se quisermos reverter as graves consequências impostas pelas mudanças climáticas, potencializadas pela lógica produtiva capitalista que não ver problema em derrubar a floresta, matar os rios, envenenar pessoas e o ambiente com sua sanha crescente de ampliação de lucro.
Pensar o desenvolvimento amazônico exige da sociedade brasileira o reconhecimento das vozes que ecoam da região, como ecoou os versos da professora Liduina, do Maranhão, ao bradar a defesa de nossas águas, poluídas com mercúrio, amônia, chumbo, bório, cromo, alumina e alumínio. A água deve ser vista como um bem comum dos povos da Amazônia, deter seu contrabando por navios que navegam pelo rio Amazonas possui a mesma importância que combater a privatização da água ou o cerceamento de acesso por comunidades rurais, fatos que pululam pela Amazônia em virtude dos grandes projetos empresarias que cercam territórios, extirpando do povo o direito de viver.
A soberania alimentar deve ser o principal foco impulsionador na região amazônica. O petróleo, o ouro, a bauxita ou a cassiterita são processos extrativistas que não alimentam as pessoas, promovem apenas a destruição ambiental e a pobreza. Some-se o agronegócio e a grande carga de agrotóxicos utilizada que ampliam o sofrimento da mãe terra, como chamava nosso querido artivista Jaider Esbell.
O governo deve priorizar a produção de alimentos, por meio de métodos agroecológicos, para isso necessitamos inverter a lógica de financiamento do Estado brasileiro que prioriza a soja ao invés da mandioca, ou mesmo, o uso de sementes transgênicas em detrimento das sementes crioulas, essas garantem a reprodução da segurança alimentar, as primeiras são sinônimas da esterilidade da ancestralidade nos corredores da administração pública amazônica.
Projetar uma nova forma de vida na Amazônia exige a superação da masculinização como centro cultural do criar e pensar na região. Precisamos cada vez mais promover os espaços às amazônidas, fazendo ecoar pelo mundo o olhar das trabalhadoras do campo, das águas e da floresta, as quais por compreender sua ancestralidade lutam pelo direito a proteção de suas referências culturais e resistência a violência contra mulher, outra perversidade herdada da truculência patriarcal imposta pelo capitalismo e muitas de suas formas de controle religioso de mentes.
Mudar exige não apenas: a luta pelo fim do desmatamento; o fim da contaminação do solo, água e pessoas com metais pesados; a defesa da agroecologia; as moratórias contra a mineração, a soja e o gado. Impõe a necessidade de rompimento com o modelo patriarcal que por meio de sua consolidação econômica, representada pelo capital, conduz mulheres e crianças a terem estupradas suas consciências, apenas pelo direito constitucional de comer.
Neste contexto é fundamental compreender que a apropriação da lógica ecológica pelo capitalismo é uma realidade. A cúpula da Amazônia que ocorrerá em Belém, no mês de agosto, bem como a COP 30 projetada para ocorrer na mesma cidade promoverão a premissa do capital verde. Não há possibilidade de promover a vida e a defesa dos povos com a ampliação do agronegócio e a mineração, ambas as ações potencializador da devastação ambiental ou mesmo a monetização da floresta que propõe grana a especulação, não ao povo. Nossos corpos e nossos territórios não se encontram a venda, como defendem muitos representantes políticos. Muito menos estão à disposição para continuar a potencializar um modelo econômico deturpador dos interesses comunitários.
Por último, é fundamental que as vozes da região possam ser ouvidas no processo de formulação do pensar a Amazônia. Não haverá um projeto de reversão da atual política destrutiva se indígenas, quilombolas, ribeirinhos e a classe trabalhadora em geral não tiverem seu direito à fala. Não são os frios corredores de Brasília, Washington, Bruxelas, Paris ou Berlim que terão a efetiva representatividade. Muito menos os organismos internacionais, por mais dedicados que sejam a proteção ecológica, não possuem a legitimidade de pensar a nossa região. Bem como a academia, apesar das importantes contribuições, não pode compelir a verdadeira essência das vozes que sustentam a Amazônia.
Esse é um debate fundamental aos amazônidas, consolidado sem paixões, mas com a clareza de que o modelo capitalista de produção por essência é fomentador da destruição ambiental e de pessoas, além de indutor da crise climática que vivenciamos. No entanto, não conseguiremos avançar na proteção da Amazônia enquanto nosso orçamento público estiver capturado pelos interesses da especulação financeira, deixando de atender as necessidades do povo e aprisionando as milhares de experiências fomentadoras da vida, existentes nos territórios e negadas pela lógica de acumulação capitalista que sequestrou o orçamento público. A salvação da Amazônia será protagonizada pelos amazônidas, em aliança com a classe trabalhadora dos outros biomas brasileiros.
APEQUENADA
A ca$a legi$lativa de Roraima sempre foi um pêndulo pró-governo. Trabalha na perspectiva de promover os interesses e negócios da maioria dos parlamentares. Vemos claramente o crescimento patrimonial da grande maioria que passa pelas cadeiras da fortuna. No entanto, a posição dos Deputados Estaduais em submeter-se aos caprichos do governador de forma tão servil, nunca tinha sido observada. A escolha de Simone Denarium, esposa do governador agiota – conforme denúncia do MPF – demonstra que o soldado encontra-se na presidência da ca$a para receber e cumprir ordens. Apenas 7 Deputados resolveram não seguir os ditames autoritários do Governador do Estado.
O resultado prático deste processo é a demonstração da ausência de força de Mecias de Jesus dentro do parlamento estadual. Seu candidato teve apenas 4 votos, essa realidade demonstra que a aristocracia agrária tomou conta do poder político em Roraima, consolidando-se como uma verdadeira força política, destronando outros atores representantes da direita e centro-direita roraimense.
A votação demonstra que as pedras do xadrez político começarão a se rearranjar no intuito da sobrevivência política de seus interesses pessoais e negócios estabelecidos. A aproximação, dos outrora inimigos Mecias e Jucá, é para minha pessoa um dos movimentos a acontecer, pois o primeiro não terá a vaga da reeleição em 2026, ao senado, espaço cada vez mais consolidado por Denarium que consegue com a entrada de sua esposa no TCE começar a interferir diretamente na relação política com outros poderes e Entes federados.
O próximo passo será o já anunciado pelo Sampaio (Republicano), partido que possui 4 Deputados Estaduais. Porém, durante a sessão de hoje foi dito pelo mamulengo de Denarium que preside o legi$lativo estadual que o Republicano tinha 3 deputados estaduais, a mesma quantidade do PP, partido do Governador. A mudança de Sampaio do Republicano é um fato concreto, pois entre a tutela de Mecias, ele preferiu a tutela do Governador. Neste contexto teremos o início de mudanças no quadro político. Espero que o racha na direita roraimense possa ser aproveitado pela centro-esquerda e esquerda para tentar suspirar e contrapor projetos de Estado.
ACERTOU
Em seu discurso o presidente Lula na cúpula do G7, ocorrida no Japão neste final de semana foi assertivo em sua intervenção ao defender mais uma vez a paz como ferramenta necessária à promoção da vida e da superação da fome no mundo. Seguindo essa linha apresentada desde a campanha de 2022, Lula, defendeu a reforma do conselho de segurança da ONU, não apenas em torno da inclusão de novos membros – processo necessário ante a multipolaridade estruturada nas relações internacionais – mais também em seu conceito de existência, ao denunciar que o conselho criado para evitar guerras, possui entre seus membros países que promovem guerras para atender interesses econômicos ou políticos. Por último, cobrou das iluminadas nações que integram o grupo dos 7 países subservientes aos EUA, um olhar para outros conflitos regionais que promovem mortes e são invisibilizados pela ONU e seu conselho guerreiro, entre estes conflitos citou a guerra entre os estados da Israel contra a Palestina que vitimiza milhares de palestinos todos os anos.
SOFRIMENTO
Anualmente os assentados da reforma agrária de Roraima são expostos a terríveis condições de sobrevivência em virtude do período chuvoso de nosso verão amazônico. Já são várias localidades isoladas, sempre em virtude dos mesmos trechos impedirem a locomoção de pessoas. Parte de nossas crianças e jovens ficarão sem aula mais um ano, prejudicando seu aprendizado, diminuindo sua capacidade de disputar espaços – por isso combato essa retórica segregadora da meritocracia. É fundamental que possamos impor mudanças na política de manutenção das estadas vicinais, garantindo na prática prioridade na solução dos pontos de estrangulamento que reproduzem os mesmos impasses todos os anos, em virtude das cheias de igarapés e córregos.
INVESTIGAÇÃO
Finalmente o MPF resolveu se movimentar e abrir uma investigação sobre o processo de titularização de terras no Estado de Roraima. As terras transferidas da União ao Governo Federal sofreram um verdadeiro rateio para especuladores do campo, oriundos do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná e Rondônia. É fundamental que as ações policiais protagonizadas em 2010 que identificaram uma atuação do Iteraima na grilagem de terras seja recapitulada, pois o marco temporal da ocupação mansa de terras públicas era o ano de 2009, quando o governo Lula assinou o Decreto de transferências de terras da União ao Estado.
No entanto as premissas destas parcelas serem destinadas prioritariamente para reforma agrária não foram observadas pelos governos de Roraima. Com a chegada de Denarium ao palácio Hélio Campos, antigo 31 de março, foi promovida a elaboração de uma revisão da Lei de Terras, facilitando a regularização fundiária de até 2.500 hectares, bem como a destinação de novas áreas aos pecuaristas e sojeiros do Estado ou aos recém-chegados, criando vários problemas fundiários de sobreposição de fazendas sobre áreas já destinadas, especialmente assentamentos da reforma agrária, a exemplo do PA Jatobá, o município do Cantá que sofre pressão da madereira Vale Verde.
Não é a toa que representantes do governo falam em vender Roraima, como já tratei por aqui em outra publicação. Ocorre que essa Lei de terras ampliou o marco temporal para o ano de 2016, regularizando todas as terras que se encontravam no passado, inseridas em ocupações irregulares em virtude de não respeitar a legislação. As investigações poderão contribuir e potencializar a revisão dos crimes de grilagem de terras públicas encobertados pelo Governo.
INVESTIGADO
O presidente da CPI do MST, uma orquestração da direita brasileira para tentar vincular o governo as ocupações de terras promovidas pelo movimento, possui como presidente o Tenente-Coronel Zucco (Republicanos/RS). Na última quarta-feira o ministro Alexandre de Morais do STF autorizou a PF, depois de pedido do MPF, a investigar o Senador da República em virtude de financiamento dos atos golpistas ainda no ano de 2022, especificamente com o bloqueio de estradas, após a vitória de Lula. A CPI ainda possui como relator o Deputado Ricardo Sales (PL/SP), aquele que defendia passar a boiada da desregulamentação das normas ambientais enquanto a população estava preocupada com a Covid19. Ele é investigado em vários inquéritos, um deles apura o vínculo com suporte a grileiros de terra na Amazônia quando atuava como ministro do meio ambiente de Bolsonaro.
Bom dia. Um forte abraço.
Fábio Almeida
Jornalista e Historiador.
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