A decretação do estado de emergência, pelo governo federal, na TI Yanomami trouxe a baila a retórica política, o velho e arcaico discurso sobre a necessidade de que os indígenas precisam evoluir. Um dos argumentos mais preconceituosos foi pronunciado pelo atual Governador de Roraima, Antônio Denarium, “os Yanomami precisavam deixar de viver como bichos”.
Ao procurar o conceito de evolução encontramos que consiste na passagem por um processo gradual de transformação. Já o significado transformar estabelece tomar nova feição, caráter, alterar-se, modificar-se. Desejam os indígenas da TI Yanomami modificar sua forma de organização social? Qual a feição que os defensores da evolução dos indígenas querem que eles tenham?
Trago esse tema na coluna de hoje, para juntos refletirmos sobre a imposição de um conceito de vida. É possível estabelecer que nossa sociedade possui uma etapa social evoluída? Acredito que essa deveria ser a primeira questão a ser respondida. Consiste em evolução destruir nosso ambiente onde moramos, comemos e bebemos? Essa deveria ser uma segunda questão na busca de respostas.
Trago as duas questões para avaliar dois pontos fundamentais neste diálogo. Inicialmente temos entre os povos da TI Yanomami uma população milenar, vivem nestas terras da bacia do branco e do orinoco a muito tempo. Se temos menos tempo de organização social, como nos consideramos evoluídos e almejamos ser referência de organização social a esses povos?
As decisões no sistema societário dos povos da TI Yanomami são tomadas pela coletividade dos indivíduos, em reuniões que devem estabelecer um consenso. Nossa sociedade delega a pessoas ricas o direito de decidir pelos pobres, enfim nos sujeitamos a uma divisão por classes, isso não existe entre os povos da TI Yanomami.
Em sua forma de produção para subsistência adotam a rotatividade do território, seja para caça, agricultura ou coleta. Decisão sábia, pois, permite que a natureza regenerar sua capacidade de reposição. Nós, ao contrário acreditamos que a acumulação privada é o único caminho para o bem-estar, mesmo que isso signifique poluir a água que nós beberemos. Isso é inconcebível na sociedade Yanomami, pois a defesa e a perpetuação do ser humano, da fauna e flora é fundamental à vida.
Bom, dirão que os Yanomami entram em conflitos por territórios, mulheres e outras pendengas. Bom, na realidade nem toda sociedade é completamente perfeita. Mas, nós neste quesito não temos muito a fornecer exemplos, tendo em vista procedermos tais ações insanas em nosso dia a dia, pior, matamos muitas vezes sem motivo aparente, apenas devido a pessoa ser negra ou indígena. Matamos por ódio consolidado não por motivos que possam ser expressos por fatos concretos, mas por desejos supremacistas.
A segunda questão permite olhar para uma questão concreta. Enquanto os povos da TI Yanomami defendem uma cultura do bem viver que consiste numa relação de interação permanente com o ambiente – denominado por eles de Mãe Terra – primando pela defesa e proteção da vida. Nós caminhamos em sentido oposto queremos destruir para construir. Somos incapazes de projetarmos um dia de vida sem agredirmos a natureza, olha que nos especializamos nisso, tanto que colocamos o mundo em risco. Vivemos em um mundo onde 2,2 bilhões não possuem água potável para beber, quase 1 bilhão não possuem o que comer. Somos nós referência de desenvolvimento?
O nosso estilo de vida permitiu o desenvolvimento de técnicas importantes que permitem o prolongamento da vida, a ampliação das possibilidades de comunicação, na garantia da produção de alimentos para bilhões de pessoas, na formatação de ferramentas. Porém, consolidamos uma sociedade de violências, principalmente sobre a premissa elementar da acumulação de capital, seja por vias legais ou ilegais – como o garimpo criminoso na TI Yanomami.
Portanto, a retórica de considerar os indígenas subdesenvolvidos reproduz um conceito supremacista, principalmente por buscar impor um estilo de vida sem ao mínimo se importar se esse modelo é o que estes povos querem para o seu bem-estar. Precisamos como sociedade aprender mais, do que ensinar.
PARA QUE UMA CASA DE APOIO?
O delírio administrativo do Governo de Roraima amplia-se a cada dia com a crise humanitária vivida pelos povos da TI Yanomami. Inicialmente o Denarium, Governador do Estado – com familiares investigados por envolvimento com o garimpo de sangue – afirmou que as pessoas filmadas ou fotografadas eram da Venezuela, conseguindo que essa retórica desinformativa passasse a ser utilizada por muitos segmentos da sociedade.
Posteriormente afirmou que o Governo não teria responsabilidade alguma com a proteção dos indígenas. Essa retórica também não deu muito certo, pois o combate ao crime que se consolida a partir de Boa Vista era uma atribuição do Estado, bem como a assistência a educação – há 5 anos que as escolas Yanomami não recebem merenda – e a garantia de acesso aos serviços de atenção secundária e terciária na saúde.
Por fim, Denarium resolveu adotar seu estilo de capanga e atirou que os povos da TI Yanomami precisavam “evoluir” e deixar de viver como “bichos”. A evolução que o Governador de Roraima defende é a mata derrubada, o pasto e a soja plantada e o dinheiro no bolso de poucos, os quais ainda possuem a isenção de impostos e taxas pela Lei 215/1998.
Essa premissa xenofóbica, ultrajante e violenta conquistou corações e mentes, infelizmente, com mandatários e representantes sociais defendendo conceitos que podem impor o aniquilamento de povos, alguns inclusive isolados, por decisão própria. A extrema direita não possui menor empatia com o povo, principalmente com as minorias que compõe a nossa sociedade.
Ante todo esse quadro o Governo Estadual resolveu dá um “revestrés”, colocando-se a disposição de ajudar. Porém, a primeira proposta é completamente desconexa da realidade objetiva. Quer Denarium construir uma casa de apoio para receber Yanomami. A proposta é ridícula e não reflete a necessidade emergencial, humanitária e muito menos antropológica. Quer desenvolver ações concretas? Pense em políticas de geração de emprego aos milhares de roraimenses desempregados que tiveram que “tentar a sorte” no garimpo, devido sua incompetência de governar.
VITÓRIA DAS MULHERES
Um grupo de 113 mulheres iniciarão essa semana o curso de formação de policial militar. A conquista foi fruto de ações judiciais julgadas procedentes, ao determinar inconstitucional a determinação do limite de 15% de vagas destinadas as mulheres, na formação para novos PM’s, isso, independente do resultado no concurso realizado. Porém, a vitória definitiva veio após dezenas de dias acampadas em frente ao palácio do Governo. Essa turma da PM conhece na prática, um pouco das iniquidades que forjam a sociedade brasileira. Desejo sucesso na formação, bem como sabedoria no desenvolvimento das atividades laborais. Tenham empatia, como muitos representantes da sociedade tiveram com a luta de vocês.
4ª VARA FEDERAL
O CNJ desenvolve auditoria na justiça federal, a fim de averiguar a efetividade das ações judiciais relacionadas ao garimpo ilegal e a proteção da TI Yanomami. A decisão de busca e apreensão na casa dos parentes de Denarium, Governador de Roraima, saíram dessa vara, um pouco antes da chegada dos corregedores. Importante, também, a averiguação pela corregedoria da devolução para empresários de equipamentos apreendidos nas escassas operações realizadas sob a gestão de Bolsonaro. Muitos equipamentos apreendidos e devolvidos aos financiadores do criminoso garimpo ilegal voltaram ao crime, por decisão da justiça federal roraimense. Inclusive existe liminares, de um ex-candidato ao senado que trabalhou naquela casa, liberando helicópteros aprendidos no garimpo.
INDEPENDÊNCIA DO BANCO CENTRAL
Consiste em uma prerrogativa que na realidade expressa uma afirmação equivocada. Não há independência nenhuma, até porque, as instituições devem trabalhar em harmonia e de forma colaborativa. Existe uma autonomia da gestão do Presidente, indicado pelo Presidente da República e aprovado pelo Senado, ou seja, a autonomia também é questionável, pois a relação do Presidente do Banco Central com as teorias econômicas da presidência é notória. Isso ocorre hoje no Brasil. Temos um comandante do Banco Central, apoiador da última candidatura de Bolsonaro, atitude que levanta muita suspeição sobre sua isenção na condução da política monetária.
Essa suspeição se amplia com a atual manutenção da taxa de juros Selic em 13,75%. Os dados econômicos demonstram que o país melhorou vários índices econômicos nos últimos 60 dias, fruto da vitória do Presidente Lula e a abertura de um governo que propõe o diálogo como ferramenta de fortalecimento da qualidade de vida do nosso povo. A decisão do Copom baseada numa suposta ampliação da inflação impõe dificuldades a política microeconômica do Governo Federal.
O primeiro impacto ocorre na necessidade de ampliar os cortes de investimentos em despesas primárias, pois, com a manutenção dos juros amplia-se a remuneração para banqueiros e especuladores financeiros, retirando recursos para casas populares, para aumentar os privilégios dos parasitas do capitalismo. Portanto, acerta Lula ao questionar o papel do Presidente do Banco Central. É preciso que a autonomia de gestão não seja compreendida com independência, pois o Banco Central precisa responder as necessidades do povo brasileiro, não da banca nacional e internacional, além de impor uma recessão sem sentido algum, ampliando dessa forma a fome e sofrimento ao nosso povo.
INVESTIMENTO EM INFRAESTRUTURA
Aloizio Mercadante anunciou que o BNDES irá disponibilizar, em 2023, 40 bilhões de reais em projetos de infraestrutura no país. Os recursos serão destinados a empresas que tenham grandes obras a serem executadas. A lógica do banco de desenvolvimento é voltar a financiar projetos de infraestrutura e exportações para fomentar a geração de emprego e renda. O financiamento da pauta agrícola também se manterá, porém, o incentivo ao cooperativismo e a agricultura familiar será uma prioridade, fomentando desta forma a desconcentração da renda e dos investimentos públicos. O BNDES é muito importante para sustentação de um programa sólido de desenvolvimento, geração de emprego e distribuição de renda. Um país grande e com um povo feliz é possível com políticas claras de investimentos, o banco cumpre esse papel, apesar dos ataques sofridos da direita e extrema-direita brasileira.
EM SANTA CATARINA
O governador bolsonarista sancionou um projeto de Lei que implanta o que popularmente ficou conhecido como “escola sem partido”, mais na realidade é uma política de patrulhamento ideológico sobre a atuação do docente. Entre as medidas aprovadas destacam-se: a) o professor deverá adotar em suas exposições as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas existentes a respeito; b) os pais poderão ter acesso prévio ao conteúdo programático e ao enfoque das aulas a serem ministradas; c) devem ainda os docentes respeitarem as convicções políticas, morais, ideológicas e religiosas das famílias.
Quando um professor de história tiver que ministrar uma aula sobre o golpe militar de 1964, deverá agora utilizar referência para ensinar que romper com a democracia é correto, se um grupo social assim desejar. Bem como que a prática de tortura é importante para tentar coletar informações de adversários políticos. Enfim, a proposta propõe na realidade a busca de um discurso único. A preocupação ocorre devido o Estado já registrar a maior quantidade de células nazistas e fascistas do Brasil.
A professora ultrabolsonarista Ana Campagnolo (PL), Deputada Estadual, não poderá mais ministrar suas aulas com a camisa de Bolsonaro como fazia antes de ser eleita para o legislativo Estadual. A lógica da Lei é criar uma patrulha ideológica contra professores. Um grave retrocesso que precisa ser repudiado por todas as entidades sindicais do país.
Bom dia. Um forte abraço.
Fábio Almeida
Jornalista e Historiador
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