Institucionalizar. Essa é uma palavra que sempre causou arrepios na vida das pessoas, especialmente as mais pobres, expostas a ausência de políticas públicas, consequentemente ao cerceamento da “liberdade”. Uma outra palavra que necessita ser ressignificada, pois há liberdade quando não se possui o poder de guarda? Exclusivamente, por outras culturas se acharem superiores e decidirem sobre vidas, sem consultas.
A palavra Institucionalização provém de dois conceitos sociológicos. O primeiro é a Instituição, palavra que possui enorme significado no contexto do contrato social, seja na definição das responsabilidades públicas do Estado, ou mesmo, na consciência imaterial como a instituição familiar ou dos filhos. A segunda palavra é Ação que consiste na prática do fazer acontecer.
Portanto, podemos conceber que a institucionalização na prática é a ação de fazer pertencer, ou seja, fazer parte de uma instituição. O objetivo central é promover um conjunto de valores e normas que permitam a reprodução do contrato social. A escola é uma das instituições do Estado burguês, quando sua escassez é uma realidade física, ou mesmo, a impossibilidade de frequência devido a necessidade de trabalho, surge outra instituição, a penitenciária, a cadeia e o nosso CSE - uma cadeia para meninos e meninas.
Uma das instituições que possuímos consiste nos lares de abrigo para crianças e adolescentes. Esses espaços idealizados na história, principalmente por segmentos religiosos ou sociais, teve na aprovação do ECA (inserir link do ECA) a obrigatoriedade do Estado fornecer esse tipo de proteção. O estatuto tornou compartilhada a responsabilidade da guarda de crianças e adolescentes, assim, a instituição familiar ou dos filhos é rompida a mando do Estado, quando existe risco à vida destes brasileiros e brasileiras.
Uma das perguntas centrais deste direito positivado na proteção de meninos e meninas, é: como atuar quando as questões envolvem indígenas? É possível termos uma criança indígena retirada da institucionalidade de seu povo ou de sua cultura? Precisamos encontrar resposta como sociedade a essas perguntas, a fim de que violências não passem a ser a prática na vida das famílias. Como ocorre hoje em Roraima.
Trago esse tema para conversar um pouco sobre um grave problema que envolve uma criança indígena Yanomami, sua família e o estado brasileiro. Para proteção das pessoas não utilizarei seus nomes reais, nem mencionarei a efetiva região de moradia destes indígenas. No entanto, essas mudanças não impedem o teu olhar de indignação, ante o caráter abusivo adotado pelas instituições públicas brasileiras.
Rael, uma criança de 3 anos de idade é removida de sua comunidade indígena, localizada na TI Yanomami, para tratar um sério problema de malária (fruto do fluxo garimpeiro ou da prestação de serviços por alimentos). Sua vinda é institucionalizada, operada pelo DSEY-Yanomami. Ao chegar, Sol e Floresta, pais da criança, são direcionadas a CASAI/Yanomami. A conflitualidade existente com outros grupos levam a saída da família da CASAI, a estadia passa a ser a rua. A criança piora, sendo internada no hospital Santo Antônio. Isso tudo, começa no segundo semestre de 2021.
Antes de continuar debatendo esse caso, é fundamental dialogar um pouco sobre a situação dos acompanhantes de pacientes vindos da terra indígena, ou mesmo, de assentamentos não terem pontos de apoio financiados pelo SUS. Hoje, os indígenas ao serem removidos, precisam ficar hospedados na CASAI, ampliando a proliferação de doenças, essa realidade precisa mudar urgentemente. A exemplo da remoção de pessoas a suas comunidades quando recebem alta, um carma que pode durar meses e risco de novo adoecimento.
A corrupção campeiou no DSEI/Yanomami. As últimas ações policiais demonstram claramente isso. Além, do ataque das quadrilhas organizadas, nas esferas públicas de saúde, a atenção aos indígenas teve reduções drásticas no financiamento das ações, chegando em 2022, ao patamar de investimentos realizados no ano de 2010. Essa realidade, por exemplo, levou à escassez de comida na CASAI/Yanomami por um longo período do ano de 2022.
Voltemos ao Rael. Removido para o hospital da criança, incompreensivelmente no registro é colocado em sua filiação a condição de indigente - os pais haviam voltado a CASAI, após a piora da criança. Começa aqui uma verdadeira peregrinação de dor, sofrimento, desespero e ausência do Estado. Enquanto, Rael encontra-se internado, a família passa a ser proibida de vê-lo, pois não conseguem comprovar o vínculo com o “indigente” e as péssimas condições de sobrevivência na cidade transformam suas vidas.
A rua passa a ser a dura casa de maus tratos regados a bebida alcoólica, amplificada pela movimentação de outros parentes da mesma comunidade que chegam a cidade doentes, muitas vezes caminhando pela BR 174. A busca pelo líder e guia faz com que a família se locomova para Boa Vista também. Em determinado momento chega-se a ter 15 pessoas da família de Floresta, nas ruas de Boa Vista, entregues a chuva, a bebida e a fome. A Funai fecha os olhos e não assumia seu papel, hoje mudou um pouquinho, mas já existem avanços.
Apoiadores sociais passam a conhecer o caso e conseguem reverter a situação da indigência, possibilitando que um ano após a chegada, os pais possam ver seu filho, inclusive, o pai pode fazer um ritual xamã na tentativa de ajudar na melhora da condição de criança que se encontra utilizando sondas nasogástricas. Neste processo, descobrimos que a criança estava sendo institucionalizada, para que fosse adotada. Um choque, maior ainda, em virtude de não ser um caso isolado.
É preciso uma investigação séria sobre os ruídos de adoção ilegal de crianças Yanomamis que estão ocorrendo, sobre a ótica perversa da indigência. Se temos necessidade de institucionalizar que escutemos os indígenas, institucionalizando, essas crianças, junto a comunidade yanomami. Ao invés de colocar crianças indígenas para adoção, por não indígenas, como defendia a ex-ministra da Família do governo anterior. Esse deve ser um último passo. Especialmente quando os pais Sol e Floresta querem a criança junto deles lá na TI Yanomami.
Porém, nem a comunidade, nem os pais foram ouvidos. Rael foi institucionalizado. Encontra-se em um abrigo. Longe dos pais, da floresta, dos irmãos há mais de um ano após a entrada no sistema de saúde. Ou seja, o Estado remove pessoas e depois as deixa sem sua família. É possível como sociedade conviver com esse tipo de Estado? Não. A proteção às nossas crianças e adolescentes corretamente preconiza a proteção da família em primeiro lugar. Por que não agir desta forma no caso de Rael?
É necessário que as organizações indígenas e os órgãos constitucionalmente responsáveis pela sua proteção, em parceria com as lideranças indígenas, promovam um olhar sobre essa situação. O objetivo central é reverter essa política de institucionalização de crianças indígenas, além de garantir uma política de cuidados adequados aos acompanhantes de pacientes, evitando que tenham que permanecer muito tempo em ambiente insalubre. No caso dos povos da TI Yanomami é necessário dialogar outras medidas importantes para a proteção deste povo que sofre com a ação do nosso estado nacional que sob a falsa alegação de muitos se encontrarem em regiões de conflitos tribais torna-se risco às crianças. Essa é a cultura deles e deve ser respeitada.
A CULPA É DA FUNAI
O panfleto de direita de Roraima que circunda nas ondas radiofônicas aos domingos entrevistou o diretor presidente da FEMARH. Na lógica do mesmo, a culpa pelos problemas de Roraima é da Funai, seja pela demarcação de terras indígenas ou inviabilidade de financiamento agrícola individual aos indígenas. É fundamental avaliar essas duas questões.
A primeira consiste em compreender que a demarcação de terras indígenas não inibe qualquer processo de produção agrícola. Porém, o financiamento da agricultura não escuta as populações, a fim de que possibilite uma estrutura de produção de alimentos. Aqui, falo da segunda premissa que consiste em um absurdo imenso. Como uma terra de caráter coletivo, assume uma perspectiva privada? Não há espaço para essa realidade. Por que o Estado não financia as produções coletivas de alimentos, propostas pelos indígenas e negadas pelo Estado.
É lamentável ver um representante do Estado brasileiro afirmar que a demarcação de terras indígenas e de proteção ambiental possui o interesse de inviabilizar o Estado de Roraima, além de ser risco de internacionalização. A inviabilidade do Estado encontra-se na priorização do financiamento da plantação de grãos e gado, em detrimento da produção de alimentos.
Bem como, na ampliação da concentração de terra que chegou a ser festejada pelo secretário de estado. Ao comemorar que um produtor possui uma área de produção de 7 mil hectares licenciada na instituição ambiental. Se ele pode usar hoje 50% da área para produção, isso quer dizer que ele é dono de no mínimo 14 mil hectares. Não é muita terra para uma pessoa só? Isso representa 2,16% de toda a terra indígena de São Marcos que possui uma média de 111,16 hectares por indígena que reside lá. Enquanto isso, apenas uma pessoa é dona de 14 mil hectares. O erro tá onde mesmo?
O CANDIDATO SOU EU
A cassação de Denarium começa a transparecer trincas políticas na base de apoio. Apesar de ter sido apresentado como candidato do Republicanos - pelo investigado Mecias de Jesus - e se apresentar como candidato de Denarium a Prefeitura de Boa Vista, o Deputado Estadual Sampaio, teve sua candidatura descartada pelo extremista de direita deputado federal Nicoletti. Este se apresentou como pré-candidato, buscando aglutinar a direita em torno de sua pretensão de governar o Palácio 9 de julho.
Segundo ele, um farofeiro, possui para isso apoio declarado de Mecias de Jesus e de Hiran Gonçalves, ambos senadores por Roraima e líderes respectivamente do Republicanos e PP. Confirmada a fala demonstra-se um distanciamento destes partidos do presidente da ca$a legi$lativa, provavelmente do próprio Denarium, apesar deste, obrigar aos senadores o compromisso de gravar vídeos em seu favor, caso contrário, perdem os espaços que possuem. E não são poucos. Apenas um deles possui mulher, filho e genro empregado com altos salários.
CID E A DELAÇÃO
A delação do tenente-coronel Mauro Cid precisa ser comprovada com provas cabais. Não é possível que o desejo de vermos Bolsonaro preso, devido os seus crimes, justifique a existência de um processo sem provas concretas, como ocorreu com Lula. No entanto, a preocupação de Bolsonaro é muito grande, tanto que ele buscou logo uma internação hospitalar para evitar uma possível decretação de prisão. Os crimes são consistentes e Cid era operador de muitos processos colocados em prática pelo ex-presidente. Normalmente debatem o descaminho das jóias recebidas, a tentativa de golpe de estado, e a falsificação das carteiras de vacina. O que teria Cid a delatar se esses dados são de conhecimento da investigação? Em minha opinião, as relações internas de uso da máquina pública para alcançar os objetivos autocratas e criminosos do ex-presidente. Essa é a principal informação que pode Cid ter repassado, para ser solto e inclusive ser cogitada a concessão do perdão judicial. A fala parece ter sido consistente, fazendo Bolsonaro ter uma nova crise intestinal.
ORÇAMENTO FEDERAL
Os novos partidos aliados do governo Lula começam a colocar suas garras orientadoras do governo para funcionar, no fundo muita gente do governo quer esse caldo grosso, indesejável a vida de milhões de brasileiros e brasileiras. Após Lira, presidente da Câmara dos Deputados, anunciar a intenção de colocar em votação a PEC 32, conhecida como reforma administrativa - na minha humilde opinião consiste em uma reforma do Estado brasileiro - o governo resolveu sentar para avaliar a proposta que por exemplo acaba com concurso público e prever demissão de todos os cargos extintos se houver déficit orçamentário.
Chegou a hora de publicizar a intenção de acabar a vinculação de gastos com educação e saúde imposta pela Constituição. O governo Bolsonaro tentou em 2019 aprovar essa proposta, sob a ótica de não desvincular, mas que o gestor pudesse investir conforme sua necessidade. Agora, querem os congressistas, acabar com a vinculação de recursos. No fundo é mais dinheiro para financiar a banca que já consome 54% de todo o orçamento federal. O povo aguenta mais um pouco de sofrimento, pensam eles, pois acreditam na incapacidade de um levante da classe trabalhadora.
Neste caminho, o secretário do orçamento federal, Paulo Bijos, informou em uma entrevista que o governo federal irá solicitar ao TCU o descumprimento do investimento de recursos mínimos em educação e saúde. Funcionário do ministério do planejamento e orçamento, comandado por Simone Tebet - uma das promotoras do documento do MDB, Ponte para o Futuro - coloca em pauta o tema liberal de sua chefe. Essa desvinculação dos recursos da educação e saúde é um dos tópicos abordados pelo liberal MDB. Parece que cada vez mais, em nome da governabilidade, o PT sente-se à vontade à mesa com o liberalismo que campeia nos corredores do congresso e nos frios corredores ministeriais.
Na realidade a frente ampla reproduz na prática o que toda pessoa de esquerda esperava, malho na classe trabalhadora, apesar das migalhas que nos será servida, por um governo que decidiu seu lado, ao buscar sustentação nos liberais que caminharam 4 anos com Bolsonaro. Não haverá mais espaço para retórica da união nacional, após esse grave ataque ao mínimo de direitos do nosso povo, neste país tão desigual. O pior é que a proposta orçamentária visa apenas garantir mais dinheiro para bancos e emendas parlamentares aos sanguessugas do congresso nacional, não para atender outros interesses da classe trabalhadora e do povo em geral.
Bom dia com alegria.
Fábio Almeida
fabioalmeida@gmail.com
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